domenica 4 settembre 2011
Os Gêmeos
martedì 2 agosto 2011
A declaração de amor do advogado
martedì 28 giugno 2011
Nomes
Éramos cinco filhos. Como os dedos da mão. Chegamos rolando, um atrás do outro com intervalos de dois anos, quase nos segurando pelas mãos, diretamente do paraíso até Via Beccari. Primeiro foram os dois gêmeos, depois uma menina. Em seguida, outro menino. Finalmente, eu. Minha mãe ao saber que estava de novo grávida, após três gestações, ficou torcendo que fosse mais um menino. Tinha já decidido o nome: Mateus, como o detestável fiscal de tributos que se tornou evangelista. Só para esclarecer, Mateus é aquele que, na pintura do Caravaggio, guardada na Igreja de San Luigi dei Francesi em Roma, surpreso, ao ser iluminado por um feixe de luz rasante, não se conforma ao saber que, bem ele, um pecador, foi o escolhido... Minha mãe queria o pôquer dos evangelistas. Graças a Gianluca, um dos gêmeos, conseguiu dois deles: João (Giovanni, em italiano, cujo apelido seria Gianni e sincopado torna-se “Gian”), o visionário e Luca, o médico. No nome composto desse gêmeo eis o “compre um e leve dois”! E Gianluca, ao final das contas, tornou-se médico e um pouco visionário. Um golpe de mestre.
Não se sabe o porquê, mas minha mãe pulou a vez com o outro gêmeo, Frederico, que adquiriu o nome em honra de um tio-avô da região da Ístria, ele sim médico e completamente visionário. Mesma sorte teve minha irmã, a daminha Sara, a princesinha da casa. Deu o nome de Marco, o evangelista na gôndola, ao quarto filho. Dessa forma, era eu quem deveria ser Mateus. Um matuto. Ao contrário, chamaram-me de Éster, que quer dizer estrela, graças à intercessão de minha avó. Foi ela, que se chamava Stella (Estrela em italiano), a propó-lo. Éster, isso mesmo, paroxítona, como um Hosana. A Mimma, nossa fiel governanta, mudou meu nome em Este, sem erre no final, mas mantendo o mesmo som. Ao visitar a belíssima mansão da família d´Este em Tívoli, achei que tudo aquilo fosse meu...
martedì 7 giugno 2011
Rainha dos tecidos, ou melhor: Regina dos tecidos
Para minha mãe existiam apenas dois tipos de cores. Os “fáceis”, isto é, que podiam ser trajados e os “pelo-amor-de-deus”. Pertenciam ao primeiro tipo os tons café-com-leite, desde o bege pálido até o mais escuro dos marrons, o azul-marinho, a cor vinho, o preto e as cores de tom pastel: amarelinho, cor-de-rosa claro, anilzinho. Escaladas entre os “pelo-amor-de-deus” encontravam-se as cores gritantes, começando da cor-de-rosa brilhoso até o roxo. E o verde esmeralda? Pelo amor de deus! Motivo: esganada pela cor turquesa, morta pelo azul elétrico. Ostentava sempre a mesma segurança em escolher os tecidos, sejam eles utilizados para confeccionar vestidos, cortinas ou calças. Os “tecidinhos” eram condenados à pena perpétua, após tê-los testados entre o indicador e o polegar com aquele gesto que, mais tarde, vi fazer pelos lojistas para indicar o dinheiro vivo...
Sua sabedoria sobre os frutos do tear derivava das visitas ao atelier da costureira da minha avó Stella, sua mãe. A Senhora Spadari (provavelmente os antepassados dela já eram do ramo, fabricando armaduras sob medida e espadas) costurava vestidos, saias e “blusette” (apesar do nome, que em italiano poderia indicar que fossem azuis, de azul não tinham nada!) para ela e para minha avó. Na minha fantasia de menina, a Spadari resplendia como Excalibur. Para mim estava sentada no trono. No lugar do cetro, uma espada. “O corte, – dizia minha mãe – o corte é tudo!” Assim declarava guerra às costureirinhas baratas e aos tecidos acrílicos. “Que delícia este cretonne!”, “Uma maravilhosa crepe de Chine!”. Nas lojas de tecidos, minha mãe rodopiava feito uma sereia nas ondas, sob os olhares admirados dos vendedores, acostumados com bem diferentes bacharéis. Um dia, numa lojinha em Via delle Botteghe Oscure (Rua das lojas escuras), para poupar-se de estender-lhe o carpete vermelho, o zeloso vendedor resolveu oferecer-lhe o gole de boas-vindas. E ela com um sorriso tudo flor-de-lis e rosas: “Não, obrigada, sou ateia!”
giovedì 19 maggio 2011
Marco
Marco foi o quarto filho. Bonito que nem um menino Jesus, chegou em junho, junto com as andorinhas. Os olhos? De anil, como o céu quando os anjos acabam de lustrá-lo. Parecia, dizia minha mãe, completamente ao avô Luciano, oficial de cavalaria, morto num campo de concentração alemão, que era, ao final das contas, o pai dela. Resumindo era aquele para o qual ardia perenemente a velinha na casa de campo da avó Stella. Talvez devido a essa semelhança, que não devia limitar-se ao fator físico, Marco sempre teve a fixação pelos soldadinhos de chumbo. Cada aniversário trazia uma ou mais caixinhas de soldadinhos airfix. Mais tarde, chegaram as formas para moldar seus próprios bonequinhos. Sem distinção, Marco pintava todos. Grandes ou pequenos, todos ganhavam fardas e baionetas com precisão de um ourives. Ao se concentrar, a língua escapava fora da boca e se esticava até alcançar a ponta do nariz. Uma especialidade que despertava toda minha inveja. Uma vez que todos estavam bem pintadinhos com rosto cor-de-rosa, barbas escuras, facões e espadas prateadas, Marco os guardava um a um, todos de pé, em certas vitrines onde madeira e vidro tinham sido encaixados a contento para receber suas criaturinhas. Cada manhã, eu e Marco – com o qual dividia o quartinho com um beliche de ferro vermelho – saíamos da cama bem protegidos pelos exércitos de liliputianos que nos acordavam brandindo espadas, lanças e revólveres. Tudo mudou quando um dos gêmeos, Frederico, tomou posse do quarto ao lado. Apenas uma parede fina, quase uma divisória, separava os dois dormitórios. Só para nos entendermos melhor, era suficiente um soco na parede e a ruína dos batalhões e das armadas era garantida. Os socos chegaram ... aos montes, assim como as notas ruins dos gêmeos na escola. Marco não perdia a calma, tranquilo abria as vitrines e armado de muita paciência colocava de pé, de novo em continência, os coitados que haviam tombado. Ao final das contas, os soldados se davam sempre bem. Não podemos dizer a mesma coisa com os canários da família.
“O que você está fazendo aí?”, perguntou minha mãe para Marco de dois anos, ou por ali, que estava quietinho, quietinho no banheiro há cerca de meia ora. “Estou – com a fala típica de quem tem a língua presa – dando o banho nos canários” respondeu chateado em tom de lengalenga. Inocente.
O professor Lodovico e sua mulher Regina (que em italiano quer dizer rainha)
Na casa dos Pontes, por tradição, os chefes de família dividiam-se em duas categorias: os professores e os marajás. Aqueles, os professores, fiéis às mulheres deles, de coluna reta, guardiães da papelada de todas as encrencas familiares; estes, mulherengos, flexíveis, inconstantes e, geralmente, eles mesmos cerne de todas as encrencas. O advogado, meu pai, que se chamava Lodovico, era da primeira categoria. Já, seu irmão, jornalista, pertencia à segunda. Ambos, o professor e o marajá, casaram-se e ambos tiveram cinco filhos. Cada um deles teve um par de gêmeos. Os “grandes” (meus irmãos), e os “pequenos”, cujo apelido, sem muita graça, era “os gemeozinhos”. Minha mãe (a mulher do professor) era o oposto de uma professora. Quando moça, enquanto suas coleguinhas usavam os cabelos bem penteados, ela os cortava bem curtinhos feito um garoto; enquanto todas se casavam de branco com longos véus até o chão, ela se casou com um vestido cuja bainha chegava apenas abaixo do joelho e, ainda por cima, com a cabeça desadorna. A mulher do jornalista (o marajá), consolava-se das falhas dele gravando as vozes dos mortos. Eu, na verdade, escutava apenas o silêncio interrompido pelo chiado da fita do gravador de cor cinza que nem um rato. Ela, com olhar de reza: “Escute! Você ouviu?”. Minha mãe, fria feito uma pedra de gelo, dava uma tossidinha e: “Vamos, ´bora... temos que ir”. Muitos anos depois, estava assistindo, para agradar outros amores, um filme de James Bond, do qual meu pai gostava que nem garoto gosta de chocolate. Fiquei pensando: “Como seria legal, se ele estivesse aqui com a gente”. Naquele exato momento escutei um barulho ensurdecedor oriundo da cozinha, como se o vizinho estivesse pendurando quadros em plena noite. Eu o interpretei assim: “Estou aqui, o que você acha?!” As vozes dos mortos.
mercoledì 18 maggio 2011
A galinha branca
Morávamos em uma mansão branca, acocorada, como uma galinha chocando ovos, no meio de um jardim, grande e verde, dividido por limites invisíveis em: pradaria (a parte mais selvagem), gramadinho (onde os irmãos jogavam futebol) e o pequeno bosque (onde o sol não conseguia mesmo abrir um seu espaço, nunca). Além disso, tinha o estradão, pista de corrida de bicicletas sem fim e os dois terraços, aquele de tijolinhos, vermelho, afetado, enfeitado com azulejos alegres com margaridas e o branco e cinza, feito com pedregulhos de rio, deformado e cheio de sobe-e-desce devido as raízes dos pínus que pareciam subir do inferno.
A mansão também era dividida. Desta vez, em duas partes bem delimitadas. Nos dois andares altos, aos quais faziam cócegas as copas dos altos pinus que chegavam até o céu, moravam os Salinas. Lá em baixo , com a grama e as flores, literalmente, na nossa cara, a gente: os Pontes. Para mim, o jardim era aquela casinha de madeira perdida na pradaria, onde se guardavam carrinhos de mão, foices, escadas. Um esconderijo, um abrigo. De repente, uma lembrança. Devia ter com uns sete anos. Corro de perder o fôlego, atrás meu pai enfurecido. “Pergunto-me e digo! (Come pode?)”, urra e eu trotando com as asas nos pés. De improviso, ei-lo em cima de mim. “Veado”, berro. Palavra da qual ainda desconhecia o significado, um arranhão. Fecho os olhos bem forte, espero o tapa. Nunca veio. Quando reabri os olhos, um de cada vez, vi meu pai caindo na gargalhada, vermelho na cara.